A Carta de Atenas de 1931 e o Casarão dos Nichele, em Urussanga – SC

Autoras: Caroline Niero e Letícia Medeiros Jacques

Localizado em Urussanga/SC, na Avenida Presidente Vargas nº07, o Casarão dos Nichele construído em 1907, proporcionou grande contribuição no desenvolvimento e história do lugar. O edifício encontra-se em um ponto de convergência de fluxos no centro histórico da cidade, e entre dois pontos muitos importantes na cidade atualmente, a Praça Anita Garibaldi, e a nova centralidade esportiva tendo como destaque o Ginásio Centenário.

O centro histórico ainda preserva grande parte do seu traçado e arquiteturas coloniais, essas com o tempo sofrendo influências de estilos. Embora essas arquiteturas não possuam o devido reconhecimento e cuidado, o conjunto apresenta grande significado para os habitantes do local representando sua identidade, onde além do valor histórico, está o valor sentimental. Portanto o entorno torna-se fator fundamental para que a conservação seja concretizada, pois abrange uma diversidade e número maior de condicionantes sustentando sua permanência.

Carta de Atenas de 1931: ´´A conferência recomenda respeitar, na construção dos edifícios, o caráter e a fisionomia das cidades, sobretudo na vizinhança dos monumentos antigos, cuja proximidade deve ser objeto de cuidados especiais. “

O casarão foi construído por pedreiros da família Fontanella para abrigar a família de Ângelo e Anita Furghesti Nichele, sendo o cenário da cerimônia matrimonial do casal. Antes de sua construção, existia no local uma loja de secos e molhados da família de Ângelo chamada Benichele e Cia. Tendo então continuidade nas atividades após a execução da obra, apresentou grande crescimento e tornou-se referencia na região. Nos fundos do lote funcionava a copa, cozinha, banheiro e varanda. Em uma sala de vidro ficava uma mesa de 18 lugares, ocupando toda a extensão do ambiente. Atrás do terreno encontravam-se plantações de verduras, frutas e parreiras. Na loja se comercializava desde comida e acessórios para casa até ferramentas e espingardas, atendendo às necessidades da colônia.

O Casarão dos Nichele se apresenta em planta quadrangular com dois pavimentos e alinhado ao limite frontal do lote. Foi construído em alvenaria estrutural de tijolos maciços com revestimento de areia e cal, barro e cimento e sobre fundações corridas de pedra. A cobertura feita com estrutura de madeira, possui quatro águas com telhas de barro do tipo capa-canal e faz uso da platibanda balaustrada.

O edifício pertence ao estilo eclético porém com algumas influências do neoclássico. Tem como características: rica ornamentação, elementos em forma de pináculos em cima da platibanda, um frontão com linhas curvilíneas, janelas com o uso do arco pleno, grande número de aberturas, uso do balcão com gradio em ferro forjado e simetria resultando numa edificação com grande valor estético e histórico para a cidade.

O edifício que já foi sede do Museu Municipal, de uma academia de ginástica, de comércio e também serviu de depósito de uma loja de calçados, atualmente se apresenta muito degradado, tanto pelo descaso quanto pelos agentes atmosféricos, tendo a umidade como principal mal para a construção que, aos poucos, está sendo danificada – podendo comprometer toda a estrutura. Além disso, a edificação está em desuso, o que contribui para a má conservação da mesma. O poder público também não contribui para a preservação do patrimônio já que o mesmo deveria tomar a iniciativa de incentivar essa história da cidade, o que não acontece – há um total descaso, visto, por exemplo, na locação da sinalização e iluminação pública em frente ao local, causando uma poluição visual.

Carta de Atenas de 1931: “Recomenda-se, sobretudo, a supressão de toda publicidade, de toda presença abusiva de postes ou fios telegráficos, de toda indústria ruidosa, mesmo de altas chaminés, na vizinhança ou nas proximidades dos monumentos, de arte ou de história.”

Em contrapartida, o casarão dos Nichele tem extrema importância para a cidade pois expressa a identidade dos moradores, é um elemento de memória e desperta a afeição dos mesmos pela obra.

De acordo com a Carta de Atenas de 1931: ´´ Quando se trata de ruínas, uma conservação escrupulosa se impõe, com a recolocação em seus lugares dos elementos originais encontrados (anastilose), cada vez que o caso permita; os materiais novos necessários a esse trabalho deverão ser sempre reconhecíveis. […]“.

 A partir desse trecho, pode-se constatar um cuidado em reconhecer o edifício como um objeto histórico não apenas nas técnicas de conservação, mas em seu valor artístico do passado representante de uma cultura. De forma que se respeite a materialidade, o estilo e os vestígios do antigo uso, restaurando os pontos mais urgentes e revitalizando-o na linguagem atual e prol da preservação do valor simbólico da obra, sempre deixando evidente a passagem do tempo, o antigo e o novo.

Segundo a Carta de Atenas 1931, ao dar uso à uma edificação histórica se faz possível sua continuidade e valorização, além de inserir no contexto da cidade, fazendo parte da história das pessoas, no cotidiano e não apenas na paisagem – atribuir uma finalidade à edificação. Para que o uso se faça possível é necessário que haja uma análise escrupulosa das patologias da edificação, principalmente no que diz respeito à estrutura já que a mesma pode influenciar no tipo do uso que a edificação pode oferecer.

Dentre todas as ações possíveis para a preservação de um patrimônio, a Carta menciona, também, a importância do papel da educação já que é através dela que é despertado o interesse e o respeito à esses patrimônios pelos próprios atores da cidade, da história. Além disso, a história repassada de geração para geração também é essencial para a preservação do patrimônio e para a disseminação da importância do mesmo. Através da conscientização é que se faz possível a identificação, a apropriação e o sentimento de pertencimento à própria história.

Texto elaborado pelas graduandas da quinta fase do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, na disciplina de Patrimônio I.
Para ver mais imagens do Casarão, acesse: http://www.panoramio.com/photo/114761533

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